Na visão da Psicanálise, o luto é um processo lento e doloroso, com características de profunda tristeza, afastamento de toda e qualquer atividade que não esteja ligada a pensamentos sobre o objeto perdido, a perda de interesse no mundo externo, incapacidade de substituição com a adoção de um novo objeto de amor. É um processo difícil, porém todos iremos passar em um determinado momento de nossas vidas, as dores não são iguais, cada indivíduo irá vivenciá-la de forma diversa, porque a morte e o vínculo que cultivamos com cada pessoa são diferentes. “A pulsão de morte é a pulsão por excelência, sendo assim a incógnita da pulsão de morte está no centro da formação do psiquismo (Sigmund, 2016).”
Em seu livro ‘O luto e a melancolia’ (1917), Freud identificou as semelhanças e diferenças entre a melancolia e o processo de luto, para a teoria freudiana o luto é um processo que tem um início e um desfecho ligado à integração do objeto perdido. Quando este processo se interrompe ou não é propriamente vivenciado, a elaboração do luto não acontece, dificultando a recuperação da libido e a volta ao interesse no mundo externo, o fracasso dessa elaboração leva a melancolia, e também até uma psicose alucinatória, levando a patologia do luto nos quais podemos incluir certos tipos de depressão. Todas essas fases e estágios também estão ligadas a perda de um amor, amizade ou pessoa querida pelo paciente, não é somente no caso de morte, mas é o caso da perda de alguém com quem se convive. Seja marido, namorado ou amigo.
A Psicanálise reconhece 4 fases do luto e 5 estágios. As 4 fases do luto são, desorientação, torpor, negação e isolamento.
Em um primeiro momento, o indivíduo tenta se dar conta do que aconteceu. Um momento de assimilação, mas também de negação e desespero diante da verdade. Nesse contexto, também é natural que a pessoa queira se isolar para que consiga fazer sentido do que está acontecendo sozinha. As pessoas que estão próximas devem aprender como agir e consolar nesse momento.
Em seguida, é muito comum passar pelo momento do choro e da procura. A realidade de não ver a pessoa querida viva novamente é muito dura. O corpo precisa colocar para fora a dor que a pessoa em luto está começando a sentir.
Uma dor profunda e desespero, nesta fase costuma ocorrer depois do velório e do enterro. Trata-se do momento em que as partes mais trágicas do processo já foram vivenciadas. Agora, é a falta da pessoa nos contextos sociais rotineiros que são responsáveis pela dor que a pessoa em luto sente. Não vê-la nos contextos de sempre e sentir a falta trazem muito desespero nos primeiros dias de vivência cotidiana.
Enfim, chega o processo de tentar organizar a vida para continuar seguindo mesmo após a morte do ente querido. A depender do vínculo, essa fase pode durar por anos.
Os 5 estágios do luto para Psicanálise são, de início a negação e isolamento. No início do período do luto a pessoa se sente muito desorientada. Nesse momento, é difícil até aceitar que a morte seja um fato real. Existe demora aceitar. Algo interessante aqui é que o primeiro dos 5 estágios do luto pode ocorrer mesmo antes da morte de uma pessoa. Assim, a notícia de uma doença terminal pode ativá-lo.
Depois, a raiva surge diante da aceitação do que está acontecendo. Trata-se de uma reação natural diante da injustiça que é ver uma vida sendo interrompida.
A barganha, surge então uma diferença marcante entre os 5 estágios do luto para a psiquiatria e as fases previstas pela psicanálise. Há um momento em que o indivíduo enlutado recorre à esperança de uma cura ou ressurreição milagrosa ante a finitude que é a morte. É a hora em que se prometem as coisas mais loucas ou as pessoas pedem que sejam levadas no lugar de quem partiu.
Temos também a depressão, onde o indivíduo enlutado tem a oportunidade de fazer uma reflexão profunda sobre a vida. Neste momento, a solidão se faz muito presente e a dor também. Aqui é muito fácil traçar uma semelhança com o momento de dor profunda e desespero, melancolia.
Finalmente, chega o momento da aceitação. Para o enlutado, é o momento em que a saudade se torna mais sossegada. A pessoa lida com a perda de maneira mais pacífica e até começa a ter condições de se reorganizar na vida. Nesse contexto, esse estágio parece anteceder a fase de reorganização. Entretanto, por outro lado, no caso do doente, há uma aceitação da condição. A pessoa contempla o futuro com mais paz e menos expectativas de cura.
Todas essas fases do luto, nos remete em como estamos cuidando da vida e do tempo, para que o indivíduo possa elaborar bem esses estágios do luto, é muito importante vivenciar os momentos da vida com equilíbrio e aproveitar o tempo ao lado das pessoas que são importante para o convívio pessoal e social, sendo assim, seja um termino de um relacionamento ou a partida de alguém querido, esses momentos fazem parte da relações humana, e passar por esses estágios, da vida, do tempo e da morte fazem parte do desenvolvimento humano.
Em uma sociedade voltada para o imediatismo é muito comum que as pessoas digam que não tem tempo para perder sofrendo e vivenciando o luto, porém passar pelos estágios do luto, é muito importante, a psicanálise nos ensina que esse processo de elaboração do luto é um processo natural e deve ser vivenciado pelo indivíduo, cada um no seu tempo e no seu momento, e demonstrar suas emoções, possibilitará viver sua realidade da melhor forma possível, sendo assim o que lhe causa aflições nesses momentos vividos fazem parte da relação humana com o mundo, que acontece no tempo presente assim como poderá acontecer no futuro.
Karina Statuti
Psicanalista Clínica e Psicopedagoga
Referência
ZIMERMAN, D. E. Fundamentos Psicanalíticos [recurso eletrônico]: Teoria, técnica e clínica. Porto Alegre: Artmed, 2007. Editado também como livro impresso em 1999.
ISBN 978-85-363-0814-2
Freud, S. (2014). Luto e melancolia. São Paulo: Cosac Naify.
Sigmund F (2016). Além do princípio do prazer. Porto Alegre: L & PM.
https://revistapsicofae.fae.edu/psico/article/view/226 “Teoria do Luto em Psicanálise”. Christian Ingo Lenz Dunker. Acesso em junho/2022.