Com uma visão própria Wilfred Bion demostra uma fidelidade ao método e pensamento psicanalítico.

Wilfred Bion, nasceu na cidade de Muttra, na Índia, em 1897. Filho de pais britânicos, mudou-se para Inglaterra aos 8 anos para estudar, alistou-se no exército aos 19 e saiu após a Primeira Guerra para ingressar na universidade de Oxford. Estudou História, Filosofia, Teologia e licenciou-se em Letras. Após entrar em contato com as obras de Freud, resolveu cursar medicina e formou-se aos 33 anos. Bion começou a estudar psicanálise, sendo supervisionado por Melanie Klein.

Em contato com de Melanie Klein, Donald Winnicott e Herbert Rosenfeld, Bion iniciou suas próprias teorias. Isso ajudou a elevar seu nome na comunidade psicanalítica e alçar seu nome ao posto de presidente da Associação do país. Com isso, até os seus últimos anos, trabalhou arduamente para propagar suas teorias sobre a psicanálise pelo mundo.

Bion, de certa forma, marcou sua presença nas duas guerras mundiais. E na segunda guerra marca sua entrada como psiquiatra. Por meio dessas experiencias, Bion ajudou milhares de soldados a lidarem com os horrores da guerra enquanto formulava o seu trabalho. Na Segunda Guerra Mundial, dedicou bastante tempo na análise de grupos e essa experiência lhe rendeu algumas obras, Intra-group tensions in therapy, Leaderless group Project e Group dynamics: a review. Bion, ingressou na Sociedade Britânica de Psicanálise e foi presidente da associação entre os anos de 1956 e 1962.

Uma das principais teorias de Bion propõe a observação do modo de pensar de um grupo. Ele aprimora a perspectiva em relação à atividade mental de diversos indivíduos. Também identifica que isso facilita a interação dos participantes, de modo que passam a interagir e agirem melhor.

Segundo Bion, os grupos simbolizam ainda o sentimento de pertencer a uma família e esse pertencimento gera reações regressivas de busca e perda de afeto, dependência, luta, fuga e acasalamento.

Wilfred Bion estabelece regras gerais direcionadas a cada configuração grupal, como a mentalidade grupal, que se refere a uma ação mental desenvolvida dentro de um determinado grupo. Ainda que muitos não tenham consciência, acabam contribuindo para dar forma a ela. Com isso, a mentalidade criada se mostra mais como um equivalente de demandas pessoais ao invés de uma simples soma. O conceito de ficar em um grupo revitaliza experiências relacionadas com fusão, encontro e discriminação. Assim, podemos observar nosso universo interno em relação a um grupo, bem como as impressões envolvidas.

O grupo de trabalho, para Bion, é um grupo reconhecido, assim como trabalha sobre o conceito de oposição e interação. Nessa trajetória, o grupo se volta às atividades combinadas dos membros de forma mais consciente. Caso queiram fazer comparações individuais, se valem do Ego consciente agindo em nível secundário.
Com o fim de explicar o grau maior ou menor de disposição do indivíduo para fazer combinações e interações com os demais, Bion criou o termo “valência” que se cruza com a vigência da diretriz básica de cada atividade proposta pelos membros de um grupo. Assim que a predominância harmônica de valências cresce, dá mais força para que o grupo fique coeso. O termo deriva da química para explicar seu processo.

No funcionamento psíquico, mesmo realizando um trabalho alinhado com grupos, Wilfred Bion também os enxergava individualmente; ele indicava que nos grupos replicávamos processos psíquicos individuais e internos. Por meio de uma dualidade funcional, mas conectada, entregávamos aos grupos o que carregávamos em nível consciente, que se refere à parte mais racional de nossa consciência abraçada pela realidade interna e externa. Por meio dela, temos controle de nossas produções enquanto estivermos despertos.
Analisando o trabalho de Bion, é afirmado que se trata de um processo secundário, uma ação específica e consciente. Em síntese, a busca de uma identidade psíquica com determinada experiência relacionada com a satisfação. O indivíduo busca mudar de forma consciente para se adaptar ao meio externo.

No nível inconsciente, Bion trabalha diretamente a parte emocional do indivíduo, sendo regido pelo princípio voltado ao prazer. Além disso, se caracteriza pela utilização do princípio primário, fazendo deslocamento, deflexão e condensação. De modo semelhante ao nível consciente, o nível inconsciente visa evitar o desprazer no indivíduo.

Bion, também defendia que o pensar surge como uma saída para lidar com a frustração. Segundo o psicanalista, se o ódio resultante da situação de desapontamento for menor do que a capacidade do ego de suportá-lo, será uma forma sadia de desenvolver o pensamento por meio do que Bion chamou de “função alfa”. Porém, se o ódio for excessivo, “proto-pensamentos” denominados por Bion de “elementos beta” encontrarão uma saída e se transformarão em agitação motora e somatização do ódio. Os “elementos beta”, que Bion chamou também de “pantalha beta”, se espalham de forma caótica e não permitem a distinção entre consciente e inconsciente ou entre fantasia e realidade. O psicanalista mostrou ainda que as “pantalhas betas” dominam os pacientes psicóticos e que os pensamentos nesses indivíduos adquirem uma dureza capaz de gerar danos reais àquela pessoa.

Além da teoria de grupos e do pensar, Bion também marcou a sua contribuição para a prática da psicanálise. Ele ampliou o conceito de memória e desejo e recomendou que a postura do analista diante do paciente fosse de alguém que abrisse mão desses elementos, inclusive do desejo de curar o paciente, e entrasse no consultório sem as lembranças da sessão anterior.

Não há dúvidas das contribuições de Bion à psicanalise, que foram extremamente importantes para ampliar e conceituar as teorias em relação à psicanalise moderna. Muitos dos conceitos desenvolvidos em suas pesquisas tornaram-se relevantes para a compreensão de trabalhos com grupos e dos fenômenos emocionais subjacentes a eles, influenciando gerações futuras de pesquisadores em diferentes áreas do conhecimento humano.

Karina Statuti
Psicanalista clínica

Referência bibliográfica
ZIMERMAN, D. E. Fundamentos Psicanalíticos [recurso eletrônico]: Teoria, técnica e clínica. Porto Alegre: Artmed, 2007.
Editado também como livro impresso em 1999.
ISBN 978-85-363-0814-2